segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Ninguém é prisioneiro do destino!

Ninguém é prisioneiro do destino!

Ninguém é prisioneiro do próprio destino! Você o escreve à medida em que vive. A existência humana, na verdade, é um caminho aberto, em constante mutação, como um livro sem palavras, que vai sendo escrito ao longo do percurso.

Amadurecer, nessa caminhada existencial, é assumir o passado, com todas as angústias e alegrias, para construir um futuro mais solidário e menos egoísta. Fui feliz? Essa não é a pergunta que me preocupa no momento! Prefiro indagar, diante do espelho: os que cruzaram os meus caminhos, receberam a melhor porção do meu ser? Poderia ter agido melhor ou, pelo menos, poderia ter pensado mais em “nós” do que em “mim”? Estou desperdiçando o meu tempo em coisas fúteis e transitórias, que mascaram o que sou de verdade, ou estou construindo pontes mais perenes entre o meu mundo interior e as conexões que criei com o mundo exterior?

As boas e más escolhas fazem parte do processo da vida, moldando o que você é agora, nesse exato instante em que lamenta o seu próprio destino.

Enquanto você paralisa a caminhada, reclamando das injustiças que sofreu, nada acontece. O mundo continua a girar, apesar de você e a despeito de você. Não espere que a Terra pare a sua viagem cósmica, para você desembarcar sua angústia.

Não reclame da sorte: o roteiro é seu e cabe a você reescrevê-lo. . .

Rio Branco, 30 de setembro de 2013.


Jorge Araken Faria da Silva Filho, um velho Escrevinhador sem Folhas.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

O sapo na panela: casamento não é assim mesmo...

O sapo na panela: casamento não é assim mesmo...

Meio de longe, mas com profunda ansiedade, tenho acompanhado o martírio de uma doce e querida amiga, alma sensível e delicada, cujo nome prefiro não declinar, já que revelarei alguns traços da sua intimidade.

Vítima de um casamento sem confiança, repleto de traições e suspeitas, essa doce pessoa, obcecada pelo medo de ficar sozinha, paralisou a própria existência, vivendo, entre lágrimas furtivas, uma relação de dependência emocional e econômica, que ela confunde com amor.

Tem medo de voltar para casa, e não ser aceita ou, pior ainda, de ser machucada pelos sermões da sua mãe, timoneira experiente, conhecedora de tempestades e tormentas, que lhe disse para evitar mares bravios. Mas ela, teimosa, destemida, quase imprevidente, embarcou nessa aventura, sem bússola ou mapas de navegação.

Carente de afeto, sem autoestima, apaixonou-se, à primeira vista, pela imagem de um príncipe em seu cavalo branco... Mas não existe amor à primeira vista: amor idealizado não é amor, é paixão!

Entre cenas de amor fingido, promessas de mudança, sempre descumpridas, sexo mecânico, gozos simulados e acusações sem fim, ela se acomodou numa existência sem perspectivas, quase sem sonhos.

Num domingo, já com a voz embargada, ela me ligou: “eu não traio, mas quem não dá assistência, abre a concorrência”. Parecia um diálogo de Nélson Rodrigues... Perguntei-lhe, então:

— Isso é casamento? Era isso que você imaginava quando se casou?

— Sou uma moça simples, de família humilde e honesta. Considero o casamento como uma instituição sagrada, que deve ser levada para o túmulo. — Ela me respondeu entre soluços amargurados.

— Mas você se considera casada? — Insisti, aflito com o seu sofrimento, mas acreditando que ela, na verdade, tinha medo de ficar sozinha.

— Nem sei o que responder! — Disse-me, resignada, quase letárgica.

Lembrei-me, não por acaso, de uma antiga fábula, que simboliza a acomodação na angústia e no sofrimento, causada pelo medo de ficar sozinho, sentimento que inspira a minha amiga na sua resignação diante de uma vida de raros prazeres, quase sempre migalhas, jogadas como recompensa por seu silêncio conformado.

Segundo a fábula, se um sapo for colocado numa panela com água fria, retirada da sua própria lagoa, ele fica paralisado, se o líquido for aquecido lentamente, morrendo, sem reagir, quando a água alcança determinada temperatura. Morre cozido, mas aparentemente feliz e acomodado na sua lenta rotina de sapo, sem grandes emoções. Não reage à mudança no ambiente, se ela for gradual. Ao contrário, diz a mesma lenda, se você o jogar na água em ebulição, ele salta da panela num piscar de olhos, com algumas queimaduras, porém vivo.

 Moral da história, querida amiga: não se acomode a uma rotina infeliz, com medo de ser ainda mais infeliz sem ela! Se a vida a dois lhe proporciona mais dor do que prazer, se as lamentações tomaram o lugar dos sonhos, mude o olhar sobre os seus caminhos!

É normal o medo de se separar, de ficar só, de sentir falta do outro, de não encontrar um novo amor, medo do desamparo, de não conseguir se sustentar, de se sentir jogada fora. Todos sentem isso, mas nem todos percebem que a água está lentamente se aquecendo, e que é preciso saltar do relacionamento, antes da ebulição. Casamento desfeito não significa vida desfeita! A relação com o outro é uma parte da sua existência; tente não fazê-la o seu único sentido.

Para essa amiga, contudo, a felicidade está sempre em outra pessoa, enfim, na alteridade, e não em si própria. Ela só se imagina feliz e realizada, se tiver alguém do lado, verdadeira muleta, pessoa imaginária, que idealiza como onipresente, com qualidades infinitas, mas sem defeitos humanos.

Esse tipo de pessoa, espelho do que fui a minha vida inteira, paga qualquer preço por uma companhia, vivendo a pior solidão do mundo: a solidão acompanhada.

Pelo simples medo de ficar sozinha, paralisa a sua vida num interminável suplício, aceitando traições e ofensas, não só morais, como físicas, apenas para manter a aparência, na verdade, para conservar insepulto o cadáver de um relacionamento que já morreu.

Conheço muitos casais de estranhos, que convivem no mesmo ninho, ocupando o mesmo espaço físico, mas sem qualquer sintonia na alma e nas emoções. As carnes se penetram, mas os espíritos não se tocam. Caminham como mortos-vivos, sem sangue nas câmaras do coração. Por vezes, nem o sexo resiste... Mal se falam, nunca não trocam olhares furtivos, nem escutam silêncios! Por temerem a solidão, eles se martirizam e trocam insultos, permanecendo como reféns voluntários nessa prisão sem grades. Tão obcecados se tornam com o cadáver da relação conjugal, que preferem não sepultá-lo. Escolhem o automartírio, sem perceber que a solidão, o mal que tanto desejam evitar, já os contaminou de morte.

Infelizmente, o medo da solidão nos paralisa! Entramos em pânico, quando imaginamos a ideia de separar e ficar só! Até a palavra solidão nos apavora. Vou sentir falta do ex? Vou sobreviver sem ele, sem a sua conta bancaria? Nessa hora, engolimos sapo, para não cair no desamparo da solidão!

O problema é que idealizamos muito, depositando, numa pessoa imperfeita, emoções, virtudes e sentimentos angelicais e perfeitos. As relações humanas, sobretudo os casamentos e namoros, não são depósitos de felicidade.

Não busques a completude em ninguém, querida amiga, a não ser em ti mesma, nem imagines que pessoas imperfeitas viverão amores perfeitos. Ninguém se transforma em santo, só porque tu desejas, nem porque se casou contigo. Muitas coisas vão continuar faltando na tua vida, e caberá a ti encontrá-las, e não ao objeto da tua paixão, que é um ser humano, contingente e imperfeito, como tu também és. Ninguém pode ser o bonde dos teus desejos!

Não esperes que o parceiro, ser humano, cheio de falhas, preencha o espaço das tuas frustrações, nem que satisfaça a todas as tuas necessidades Em pouco tempo, as máscaras cairão e tu começarás a perceber a realidade por trás da fantasia.

Quantas vidas se perderam na infelicidade, pelo simples medo da solidão! Muitas vezes, preferimos continuar na panela, sem perceber que a água está aquecendo, lenta, mas inexoravelmente. Para se defender da solidão, muitos preferem não pensar no que está acontecendo, esquecendo-se de saltar da panela antes de morrer, senão física, mas emocionalmente, o que é ainda pior.

Não te enganes: casamento não é assim mesmo! Esse é o verdadeiro perigo: a acomodação na zona de aparente conforto! Se não tiveres coragem de sair da panela, terás o mesmo destino do sapo acomodado.

Eu mesmo, depois de uma profunda catarse, que modificou a perspectiva da minha caminhada existencial, percebi que é mais saudável sofrer as dores, enfim, entender o significado dos meus tormentos, do que eternizá-los sob o manto da ignorância.

Só compreendendo a sua gênese mais profunda, pelo autoconhecimento, posso expor as feridas à ação cicatrizante do oxigênio, modificando os rumos da trajetória antes do precipício.

E o caminho mais perene, embora cheio de espinhos, é o que transita pela consciência plena dos sofrimentos, que devem ser examinados à luz do dia.

Anestesiado, posso até não sofrer por algum tempo, mas acabarei ocultando, sob o tapete da minha covardia e imaturidade, um cadáver que permanecerá insepulto, assombrando os meus sonhos por toda a vida e me impedindo de sonhar novos sonhos.

E os meus tormentos, por mais que me pareçam insolúveis e injustos, por mais que me pareçam exclusivos, como se expiasse os pecados do mundo, podem ser mais comuns do que imagino, alcançando pessoas aparentemente felizes, que vivem na ilusão. Pessoas diferentes, dramas que se assemelham! Assim na vida, como na arte, que se imitam mutuamente, os nossos enredos se tocam em planos misteriosos.

Por vezes, quando narramos um fato de nossas vidas pessoais, traçamos, sem perceber, mas instintivamente, um arquétipo da existência humana, sensações e sentimentos que nascem da constante renovação das vivências experimentadas pelas gerações que nos precederam.

E nesse processo contínuo, em que reexperimentamos velhos arquétipos, lapidamos os nossos sentimentos, emoções, intuições e sensações, caminhando em direção ao nosso próprio eu.

Por isso, não negues o teu desamparo, assumindo uma ilusão de felicidade absoluta e bem-aventurança ou vestindo a máscara da existência perfeita, sem arestas, sacrifícios e sofrimentos, porque essa aparente proteção contra a realidade, com seus mecanismos de compensação, quase sempre alienantes (crenças irracionais, inclusive religiosas, ou o apego a esquemas mirabolantes e repentinos de enriquecimento), encobre a tua capacidade de pensar e resolver os conflitos, construindo, pela tua própria potencialidade psíquica, um caminho alternativo, certamente imperfeito, como tudo que é humano, mas feliz, apesar da finitude da vida.

Mas não nos deixemos enganar: a falsidade é um sentimento humano, quase instintivo, irmão da hipocrisia e pai da mentira. Quando a percebemos em um amigo e, pior ainda, na pessoa amada, mais do que a confiança, esvai-se o desejo de acreditar na bondade humana, uma triste e perniciosa ilusão, com a qual nos defendemos da realidade, nessa eterna busca de proteção contra o desamparo.

Para encontrar respostas, temperemos as ilusões com um pouco de realidade, sem negar os conflitos e sem esconder de nós mesmos a infinita maldade dos homens.

Enfim, não esperemos por um ser humano perfeito, que nunca vá nos desamparar, alguém que haverá de adoçar a nossa vida com gotas de felicidade, porque, vivendo na ilusão, até podemos encontrar uma frágil e temporária proteção contra o desamparo e a solidão, mas deixaremos de exercer a nossa potencialidade criativa, experiência multifacetada e rica, que revela a singularidade da vida humana.

A felicidade está em ti, minha querida amiga, e não nos falsos amigos e amantes de coração vazio! Cresce e deixa a carapaça da tua infantilidade! Não atribua ao objeto da tua paixão a culpa dos teus males, porque cada um dá apenas o que tem! De um coração pérfido, só podes esperar a perfídia!

 A culpa é tua, porque abdicaste da própria felicidade, entregando o teu destino nas mãos de outra pessoa, mesmo sabendo que a maior interessada eras tu, e ninguém mais..

Acorda enquanto a água ainda está morna! Se as lamentações já começam a tomar o lugar dos sonhos, não esperes a luz acender-se sozinha! Levanta e liga o interruptor! Mexe a tua vida sem culpa, porque a pior solidão, a mais profunda e duradoura, é essa em que tu sobrevives, minha doce amiga! Mas não mintas para ti mesma.

A prisão sem grades é o pior dos cárceres, porque as correntes estão na nossa própria mente!

Por carência afetiva, religiosidade autoimolante ou simples medo da solidão, algumas pessoas se acomodam em seus casamentos infelizes, como os sapos na água quente, e ainda se tornam obcecadas com a ideia de que foi Deus que as uniu aos seus parceiros... As más escolhas são atribuídas ao Diabo, e as boas a Deus, como se nenhuma delas fosse fruto do livre arbítrio. Automartírio não é destino, mas escolha.

Na verdade, o que tu chamas de destino é apenas o inconsciente dirigindo a tua vida. Conheça teus próprios limites, enfrenta teus demônios, reformula-te a ti mesma, mas não tente mudar o objeto da tua paixão. Sai da zona de conforto, antes que as fronteiras do destino se apertem diante de ti.

E acima de tudo, acredita na utopia, se a realidade te sufoca!

Querida amiga, esperas muito e ages pouco:

Nesse triste vazio, que te dilacera o peito,
Contemplas a solidão.
Choras o destino, mas não te moves!
Sentes pena de ti?
Pobre criatura. . . É domingo!
Escuta o silêncio à tua volta!
Teu quarto, espaço das tuas quimeras, catedral de profundos amores, agora é o esquife das tuas ilusões.
A multidão lá fora, bradando as suas desventuras, corpos ardentes, camas quentes, carnes que se penetram em gozos sem fim.
E tu, tão só, alma errante, de coração partido, condenado a eternas noites de luto!
Morreste? Não, tu não morres. . .
Consola-te: ainda tens o telefone em tuas mãos trêmulas, testemunha efêmera da felicidade que navega todos os ventos, e nunca te alcança.
Mas ele não toca. . . Ele não vibra. . . Ele não fala. . .
E tu não morres. . .

Jorge Araken Filho, apenas um coletor de palavras perdidas nos ermos do tempo.